Pesquisa detalha ação benéfica da carnosina em músculo humano

 – Jornal da USP

Estudo avaliou ciclistas suplementados com beta-alanina 

O estudo, que utilizou amostras de músculo de ciclistas, mostrou o efeito antioxidativo do suplemento beta-alanina – Foto: José Caragol via Visual Hunt / CC BY-NC-ND

Diversos estudos nos últimos anos vêm associando a suplementação com o aminoácido beta-alanina a uma melhor performance em exercícios físicos de alta intensidade. O efeito seria devido ao aumento das concentrações intramusculares da carnosina, uma molécula que favorece a atividade das células musculares por meio de diferentes mecanismos. Entre eles está um processo chamado detoxificação de aldeídos reativos, que são compostos envolvidos na progressão de algumas doenças. Agora, cientistas apresentam novos detalhes do processo de detoxificação em um artigo recém-publicado na revista Redox Biology. O trabalho foi realizado em colaboração de pesquisadores do Cepid Redoxoma, liderados pela professora Marisa Medeiros, do Instituto de Química (IQ) da USP, com os professores Guilherme Giannini Artioli e Bruno Gualano, da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP.

No trabalho foram utilizadas amostras de tecido muscular de ciclistas suplementados com beta-alanina após prática de exercício intenso. Nessas amostras, os pesquisadores detectaram a interação entre a carnosina e diferentes tipos de aldeídos reativos.

“Nossos resultados revelam um dos papeis fisiológicos da carnosina muscular, especialmente durante o exercício intermitente de alta intensidade, e pode explicar seus efeitos ergogênicos [que aumentam a capacidade para o trabalho corporal] e terapêuticos. A importância desse trabalho é o fato de mostrar mecanismos específicos da detoxificação de aldeídos reativos em amostras de tecido humano”, afirmou Marisa Medeiros.

Exercício físico e estresse oxidativo

A prática de exercício físico provoca aumento do chamado estresse oxidativo, isto é, um incremento de moléculas reativas que podem reagir com DNA e proteínas, danificando o organismo. Dentre essas moléculas temos os aldeídos reativos, muitos dos quais têm propriedades passíveis de causar mutações e câncer. Portanto, reduzir a concentração de aldeídos é essencial para a função celular normal.

Para lidar com essas moléculas tóxicas, os organismos vivos desenvolveram mecanismos de defesa e de detoxificação. Um deles é a carnosina, que interage com alguns aldeídos para formar compostos menos reativos e mais facéis de eliminar pelo organismo, que recebem o nome de adutos.

A carnosina é encontrada em vários tecidos, sendo que nos músculos esqueléticos e no cérebro está presente em altas concentrações. Além da ingestão de carnes na alimentação, a forma mais efetiva de aumentar os níveis de carnosina nos tecidos é a suplementação com o aminoácido beta-alanina, um dos seus precursores.

Para Marisa Medeiros, a capacidade de sequestrar aldeídos é uma hipótese provável para explicar muitos dos efeitos atribuídos à carnosina. E, para testar essa hipótese, seu grupo desenvolveu uma metodologia ultrassensível e altamente específica, capaz de quantificar em tecidos humanos e fluidos biológicos a carnosina e moléculas associadas.

“Embora a carnosina seja conhecida dos cientistas há muito tempo, para desvendar os mecanismos pelos quais ela atua e conhecer seus alvos biológicos são necessárias técnicas que permitam mensurar o que está acontecendo nos tecidos”, afirmou.

O estudo

Com esse método, os pesquisadores analisaram amostras de músculo de 14 ciclistas, após testes de ciclismo intermitentes de alta intensidade, antes e depois de 28 dias de suplementação com beta-alanina. Nas amostras quantificaram  o número de adutos formados por carnosina e diferentes tipos de aldeídos reativos.

Os dados mostraram que a suplementação com beta-alanina aumentou o conteúdo de carnosina muscular em cerca de 50%. Eles viram também que, após o exercício com a suplementação com beta-alanina, houve um aumento significativo da formação de adutos carnosina e um tipo específico de aldeído reativo chamado acroleína. E o interessante é que nem o exercício sozinho nem apenas a suplementação aumentaram a formação de adutos. Esses resultados evidenciam que a carnosina funciona como um sequestrador de acroleína no músculo esquelético, o que é importante para a detoxificação de aldeídos gerados durante o exercício.

Segundo os pesquisadores, estes novos resultados podem não apenas beneficiar diretamente os atletas que participam de treinamento intensivo, mas também permitir que cientistas explorem o papel da carnosina muscular na detoxificação de aldeídos reativos em doenças caracterizadas por estresse oxidativo anormal.

O próximo passo do grupo será estudar os efeitos da suplementação com beta-alanina em um grupo de pessoas idosas. “Com o envelhecimento da população, é importante termos recursos que contribuam para a melhora da força muscular de idosos. Além disso, a carnosina também pode ser eficaz para combater a dor crônica, associada ao acúmulo de aldeídos”, disse Medeiros.

O artigo Exercise and β-alanine supplementation on carnosine-acrolein adduct in skeletal muscle, de Victor H. Carvalho, Ana H. S. Oliveira, Luana F. de Oliveira, Rafael P. da Silva, Paolo Di Mascio, Bruno Gualano, Guilherme G. Artioli e Marisa H. G. Medeiros, pode ser lido aqui.

Adaptado de Maria Celia Wider / Assessoria de comunicação do Cepid Redoxoma

Mais informações: e-mail mhgdmede@iq.usp.br, com a professora Marisa Medeiros

VOCÊ PODE GOSTAR ...