Nível de melatonina pode indicar grau de malignidade de tumores

Quanto maior a produção de melatonina pelas células tumorais, menos agressiva é a doença, aponta pesquisa feita na USP

Amostra de tecido (ao fundo) e molécula de melatonina – Fotomontagem sobre imagens Wikimedia Commons

Avaliar a capacidade das células tumorais de produzir o hormônio melatonina pode se tornar uma estratégia inovadora de medir o grau de malignidade em alguns tipos de câncer, entre eles tumores do sistema nervoso central, pulmão, intestino, pâncreas e bexiga.

Em estudos conduzidos no Instituto de Biociências (IB) da USP, o grupo coordenado pela professora Regina Pekelmann Markus mostrou que, nesses casos, o nível de expressão dos genes codificadores das enzimas que sintetizam e degradam melatonina permite predizer que tumores menos agressivos produzem maior quantidade desse hormônio.

As análises revelaram ainda que a maior produção local se correlacionava com uma maior sobrevida dos pacientes. “Estamos agora avaliando em parceria com o professor Valtencir Zucolotto, da USP de São Carlos, a possibilidade de criar um kit para medir o nível de melatonina em amostras de tecido tumoral obtidas por biópsia. Além de auxiliar no prognóstico da doença, a tecnologia abriria caminho para novas abordagens terapêuticas”, disse Markus à Agência FAPESP.

Os trabalhos da pesquisadora com melatonina tiveram início ainda nos anos 1990. Por meio de estudo com roedores, ela demonstrou que o hormônio que sinaliza para o organismo que está escuro e, portanto, é hora de descansar, poderia ser produzido em outros locais do organismo além da glândula pineal, situada dentro do cérebro, como até então era conhecido.

Demonstrou ainda a importância da produção periférica de melatonina na regulação de processos inflamatórios em diferentes contextos fisiológicos e fisiopatológicos.

Grupo do IB-USP mostrou que, em alguns tipos de câncer, quanto maior é a produção de melatonina pelas células tumorais menos agressiva é a doença e maior o tempo de sobrevida do paciente – Imagem: Regina P. Markus via Agência Fapesp (traduzido)

“Mostramos inicialmente em roedores que, quando há um estímulo inflamatório em um tecido periférico e o sistema imune precisa montar uma resposta de defesa, como diante de uma infecção bacteriana, por exemplo, ocorre o bloqueio da síntese de melatonina pela pineal. Como esse hormônio impede a migração das células de defesa da corrente sanguínea para o local da infecção, a sua redução é essencial para que as células imunes atinjam o local agredido”, disse Markus. A pesquisadora abordou o tema em apresentação no dia 10 de maio no congresso Next Frontiers to Cure Cancer, promovido pelo A.C.Camargo Cancer Center em São Paulo.

Depois que a ameaça é reduzida, as próprias células de defesa passam a secretar melatonina no tecido afetado para evitar danos desnecessários. Em seguida, o organismo deve retornar à condição normal, ou seja, cessar a produção periférica de melatonina e restaurar a produção no sistema nervoso central.

A essa comunicação bidirecional entre a glândula pineal e o sistema imune o grupo da USP chamou de eixo imune-pineal. Trabalhos posteriores revelaram que a transição entre a síntese pineal e extrapineal de melatonina é regulada por um complexo proteico chamado NF-κB (fator nuclear kappa B), um conhecido mediador inflamatório.

Uma revisão sobre o tema, reunindo os principais achados de mais de 20 anos de pesquisa, foi publicada em 2017 no British Journal of Pharmacology. Entre os autores principais, além de Markus, estão Pedro Augusto Carlos Magno Fernandes e Gabriela Sarti Kinker, ambos do IB.

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