Pesquisadores alertam para riscos dos alimentos ultraprocessados

Desafio de manter uma alimentação saudável foi o tema do USP Talks de novembro. Professores da USP falaram sobre industrialização, carne, veganismo e a importância de comer comida “de verdade”

Comida fast food – foto Cecília Bastos

Há muitas receitas possíveis para se manter uma alimentação saudável hoje em dia; mas todas elas têm (ou deveriam ter) um ingrediente em comum: evitar o consumo de alimentos “ultraprocessados”. 

O termo, cunhado por pesquisadores brasileiros em 2009 — e reconhecido recentemente pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) —, refere-se àqueles produtos industrializados, cheios de aditivos e conservantes, que, apesar de comestíveis, “estão tão distantes dos alimentos naturais que talvez a gente nem devesse chamar de alimentos”.

A palavras — e os alertas — são do médico Carlos Monteiro e da nutricionista Maria Laura Louzada, ambos pesquisadores do Núcleo do Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens), da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP), e palestrantes do último evento da série USP Talks, sobre Alimentação Saudável, realizado no dia 26/11. Assista aos vídeos das apresentações abaixo.

Estima-se que dois terços das doenças crônicas no mundo — incluindo diabete, hipertensão, colesterol alto e diversas outras complicações cardiovasculares, além de vários tipos de câncer — estão relacionados a maus hábitos alimentares. E um dos hábitos alimentares mais nocivos à saúde atualmente, segundo os pesquisadores, é justamente o consumo excessivo de alimentos ultraprocessados, como refrigerantes, bolachas, salgadinhos, salsichas e hambúrgueres, doces e sorvetes industrializados, margarina, preparações de bolo, macarrão e molhos instantâneos, entre outros.

A produção e comercialização desses produtos cresceram muito desde a Segunda Guerra Mundial, “na esteira da Coca-Cola”, segundo Monteiro, ao ponto de que 60% das calorias consumidas pela população dos Estados Unidos atualmente são provenientes de alimentos ultraprocessados. No Brasil, esse índice chega próximo de 20%. 

“Há muitas evidências que essa substituição de alimentos naturais ou minimamente processados e preparações culinárias por esses produtos ultraprocessados é um dos principais motores da epidemia mundial de obesidade e diabete, por exemplo”, alertou Monteiro.

Reconhecido como um dos principais pesquisadores do mundo nessa área, ele reiterou a clássica recomendação do escritor Michael Pollan para uma alimentação saudável: “Coma alimentos. Não muito. Majoritariamente, plantas.”

Reducionismo

Maria Laura Louzada fez uma explanação sobre o Guia Alimentar para a População Brasileira, elaborado pela equipe do Nupens e publicado pelo Ministério da Saúde em 2014, com o intuito de orientar as boas práticas alimentares na sociedade. Um dos conceitos básicos do guia é que os alimentos são muito mais do que os nutrientes que os compõem, e que uma boa alimentação não pode se resumir a uma simples tabela de valores nutricionais — como preconiza a famosa, porém equivocada, “pirâmide alimentar”.

“A maioria dos guias alimentares no mundo ainda tem uma visão extremamente reducionista sobre o que é alimentação”, que enxerga os alimentos apenas como “sistemas de transferências de nutrientes”, ignorando outras características dos próprios alimentos e do ato de comer  “que também determinam a nossa saúde”, disse Maria Laura. 

Veganismo

No debate com a plateia, os pesquisadores falaram sobre a questão do veganismo e da chegada dos hambúrgueres vegetais, ou “fake burgers”, às grandes redes de fast food. 

Segundo Maria Laura, há um consenso bem estabelecido na comunidade científica de que o consumo de carne — particularmente, carne vermelha — não é ideal, nem para a saúde nem para o meio ambiente. “As carnes devem ser consumidas com moderação”, disse. Mas é preciso cuidado, também, para não substituir uma coisa por outra que pode ser igualmente ruim, ou até pior. 

fake burger que está sendo vendido nas redes de fast food, por exemplo, é um alimento ultraprocessado, feito com isolado proteico (não vegetais inteiros) e adição de corantes, aromatizantes, etc. “Do ponto de vista da saúde, ele não acrescenta nada”, disse Monteiro.

Sobre a intolerância ao glúten e à lactose, ele disse que são problemas reais, mas que afetam uma parcela muito pequena da população, e acabam sendo “magnificados” pela indústria de alimentos, com o intuito de criar novos nichos e vender mais produtos. “Muitas pessoas são levadas a acreditar que têm mais problemas do que têm”, disse.

Serviço

O USP Talks é uma iniciativa que busca aproximar a comunidade científica e acadêmica da sociedade, por meio de eventos mensais em que especialistas são convidados a conversar com as pessoas sobre temas que estão em evidência no noticiário nacional. Para acompanhar a programação e assistir aos eventos anteriores, siga nossas páginas no Facebook , Twitter e YouTube. O projeto conta com apoio da FUSP e da nic.br.

O próximo evento será uma edição especial, com quatro palestrantes, sobre a crise ambiental que ameaça o futuro do Planeta. Dia 16 de dezembro, das 18h30 às 20h, no auditório do Masp, com os especialistas Thelma Krug, Jean Paul Metzger, Carlos Joly e Gabriela Di Giulio.

Informações e vídeos do USP Talks no Jornal da USP.

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